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O Efeito Muralha: Como Patentes de Processo CHO Blindam Biofármacos Após a Expiração da Patente Original

 

A indústria farmacêutica de pequena molécula se baseia na patente do princípio ativo. Quando essa patente expira, o caminho para a produção de genéricos é relativamente direto. No entanto, o cenário é drasticamente diferente no mundo dos biofármacos (medicamentos biológicos), onde a expiração da patente da molécula ativa é apenas o primeiro passo em uma complexa jornada.

A verdadeira barreira de entrada para os biossimilares (versões de biofármacos que se propõem a ser equivalentes) reside nas múltiplas camadas de proteção concedidas aos Processos de Obtenção. Esta é a famosa estratégia do “Evergreening” biotecnológico, também conhecida como o Efeito Muralha.

O Que é o “Efeito Muralha” na Biotecnologia?

A muralha de patentes é uma estratégia legal e técnica onde as empresas inovadoras de biofármacos depositam uma série de patentes secundárias. Essas patentes não protegem o fármaco em si (a molécula), mas sim os detalhes cruciais do processo de fabricação.

Essa blindagem garante que, mesmo após a expiração dos 20 anos da patente principal, o desenvolvedor do biossimilar não possa simplesmente replicar a produção, pois as ferramentas e os métodos mais eficientes ainda estão sob exclusividade.

Nos biofármacos (como anticorpos monoclonais e proteínas recombinantes), a produção é extremamente complexa e é protegida por camadas de patentes de processo:

Tipo de Patente Protege o Quê? Como Estende a Exclusividade?
Linhagem Celular (CHO) Otimizada A CHO geneticamente modificada e selecionada para alta produtividade e perfil de glicosilação específico. O biossimilar não pode usar a linhagem já aperfeiçoada do inovador, sendo forçado a gastar milhões e anos para desenvolver uma nova linhagem que seja produtiva e que cumpra as mesmas especificações moleculares.
Meio de Cultura A composição exata dos nutrientes, fatores de crescimento e aditivos. Pequenas variações no meio de cultura podem alterar o padrão de glicosilação (os açúcares na superfície da proteína), o que altera a eficácia e a segurança (imunogenicidade) do produto.
Métodos de Purificação As etapas sequenciais de cromatografia, filtração e formulação. Estas patentes garantem que o biossimilar não possa usar a rota mais eficiente para isolar a proteína do caldo de cultura com a pureza exigida, forçando o desenvolvimento de um método totalmente novo e dispendioso.

As Três Camadas de Proteção por Patentes de Processo CHO

A maioria dos biofármacos de alta complexidade, como anticorpos monoclonais (mAbs) e proteínas recombinantes (ex: Epoetina alfa, Adalimumabe), é produzida usando células de Ovário de Hamster Chinês (CHO). O processo de obtenção neste sistema é a fonte das barreiras mais intransponíveis:

1. A Linhagem Celular CHO Otimizada (O Hospedeiro)

A linhagem CHO usada para um biofármaco inovador é uma invenção por si só. Ela foi geneticamente modificada e meticulosamente selecionada para alcançar um objetivo duplo:

  • Alta Produtividade: Expressar a proteína de interesse em níveis altíssimos.
  • Perfil de Glicosilação Ideal: Assegurar que os açúcares ligados à proteína sejam idênticos ao do produto original, o que impacta diretamente a eficácia e a segurança do medicamento no paciente.

A Patente de Processo protege essa célula CHO recombinante e seu método de seleção. O fabricante de biossimilar é obrigado a iniciar o processo do zero, gastando anos para desenvolver uma linhagem que atinja a mesma performance sem infringir a patente do concorrente.

2. As Condições e o Meio de Cultura

O meio de cultura é o “alimento” das células CHO. Sua composição exata (proporções de aminoácidos, vitaminas, tampões e fatores de crescimento) é crucial.

  • Proteção: Patentes de processo cobrem a composição específica e otimizada deste meio, bem como parâmetros de cultivo como temperatura, pH e taxa de agitação no biorreator.
  • O Impacto: Mesmo uma pequena variação nesses fatores pode alterar a estrutura da molécula e, consequentemente, comprometer a comparabilidade do biossimilar.

3. Os Métodos de Purificação e Formulação

A separação da proteína do caldo de cultura e sua formulação final é o estágio mais sensível e frequentemente patenteado.

  • Proteção: Patentes nesta categoria cobrem as sequências específicas de colunas de cromatografia, membranas de filtração, soluções tampão e até a concentração final do princípio ativo.
  • A Barreira: Ao proteger a rota mais eficiente para a pureza de 99.9%, a patente força o desenvolvedor do biossimilar a inventar um método de purificação totalmente novo, o que adiciona risco e custo ao projeto.

O Resultado: Mais Anos de Exclusividade e Alto Custo

O Efeito Muralha de patentes de processo garante que, mesmo após o domínio público da molécula, a entrada de biossimilares no mercado não é imediata.

O caminho para o biossimilar se transforma em um projeto de pesquisa e desenvolvimento de 5 a 10 anos e centenas de milhões de dólares, focado em desenvolver um processo não infringente que, ainda assim, consiga produzir uma molécula comprovadamente equivalente ao produto de referência.

Esta complexidade do processo é a razão fundamental pela qual os biofármacos mantêm a exclusividade de mercado e preços elevados por um período muito superior ao que seria esperado pela patente da molécula ativa.

Referências:

1. BRASIL. Lei nº 9.279, de 14 de maio de 1996. Regula direitos e obrigações relativos à propriedade industrial. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 15 maio 1996.

2. Site oficial do escritório Ávila Nascimento Advocacia.  Disponível em:  https://avilanascimento.adv.br/#informativos. Acesso em 2024.

3. INSTITUTO NACIONAL DA PROPRIEDADE INDUSTRIAL (INPI). Diretrizes de Exame de Pedidos de Patente na Área de Biotecnologia. Versão 2. Rio de Janeiro: INPI, 2020. Disponível em: https://www.gov.br/inpi/pt-br/central-de-conteudo/legislacao/arquivos/documentos/2020-in-pr-dirpa-118-institui-a-nova-versao-das-diretrizes-de-exame-de-pedidos-de-patente-na-area-de-biotecnologia-anexo.pdf. Acesso em: 26 out. 2025.

4. SALERNO, Mario Sergio; MATSUMOTO, Cristiane; FERRAZ, Isabela. Biofármacos no Brasil: características, importância e delineamento de políticas públicas para seu desenvolvimento. Rio de Janeiro: IPEA, jul. 2018. (Texto para Discussão, 2398). Disponível em: https://repositorio.ipea.gov.br/bitstreams/a649ad80-5612-42e8-8090-b8d050c6459f/download. Acesso em: 26 out. 2025.

5. CENTRO DE IMUNOLOGIA MOLECULAR (CIM). Linhagem celular produtora de eritropoietina humana recombinante e a eritropoietina humana recombinante produzida por esta célula. Patente de Invenção BR9905867A. Depositada em: 29 dez. 1999. Disponível em: https://patents.google.com/patent/BR9905867A/pt. Acesso em: 26 out. 2025.

 

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