por Marcello Ávila Nascimento
Negócios e fé. Há quem, maliciosamente, possa relacionar tais ideias a algum tipo de denominação religiosa. Por incrível que pareça, os dois conceitos se repetem em operações de importação.
No comércio exterior, a fé é o ingrediente mais caro e perigoso, manifestando-se como wishful thinking: a crença ilusória de que a warranty do exportador (notadamente asiáticos, grandes exportadores mundiais) e o seguro contra violação de PI serão suficientes para evitar um desastre legal no Brasil.
Para grandes importadores brasileiros que buscam maximizar a margem de lucro com produtos fabricados na China, a dependência exclusiva da warranty do exportador e de um seguro contra violação de PI é a mais clara evidência de negligência estrutural. Não é apenas risco; é uma ingenuidade estratégica que beira o amadorismo no comércio exterior de alto volume.
A verdade nua e crua é esta: o seguro de PI e a cláusula de indenização (indemnification) do fornecedor chinês são mecanismos de proteção secundária. Confiar neles como a primeira linha de defesa é ignorar a responsabilidade objetiva do importador perante a lei brasileira.
A Miragem da Garantia de Não Violação (Non-Infringement Warranty)
A Non-Infringement Warranty é uma declaração formal do exportador de que o produto que está sendo vendido não infringe patentes, marcas registradas, direitos autorais ou trade secrets de terceiros. O vendedor garante, como parte do contrato, que o produto é legalmente livre para ser vendido e usado. Se a garantia for falsa, o vendedor está em violação de contrato.
A cláusula de indenização do fornecedor chinês, tão valorizada pelos departamentos de compras, é, na maioria das vezes, uma miragem legal.
1. Inexecutabilidade Jurisdicional
Em caso de litígio de PI no Brasil, se o importador for condenado a pagar milhões em danos, a fábrica chinesa tem dois caminhos: pagar voluntariamente (o que é raro) ou forçar o importador a processá-los na China para executar a cláusula.
- O Veredito: A batalha legal no Brasil é cara. A batalha para executar esse veredito na China é exponencialmente mais cara, lenta e burocraticamente inviável.
- A Realidade: Advogados-colegas de PI em jurisdições de alto risco alertam: executar sentenças contratuais contra fábricas chinesas (pequenas ou médias) ou mesmo contra trading companies é, na prática, uma fantasia custosa. Se a fábrica chinesa for pequena ou tiver pouca liquidez, a garantia é inútil, pois a empresa pode simplesmente fechar (dissolve) para evitar o pagamento da indenização.
2. A Ilusão do Limite Indenizatório (Indemnification Clause)
Esta é a cláusula mais crítica. Ela estabelece que o exportador chinês irá compensar (indenizar) o importador brasileiro por todos os custos, despesas, multas, honorários advocatícios e danos decorrentes de qualquer alegação ou processo judicial de PI feito por terceiros.
- Mesmo que o contrato seja executável, a maioria dos fornecedores limita sua responsabilidade ao valor do pedido.
- Muitos exportadores tentarão limitar sua responsabilidade de indenização ao valor do pedido ou a um múltiplo dele (ex: 2x o valor das mercadorias).
- Isso é um risco enorme, pois o custo de um litígio e indenizações por PI pode ser dez ou vinte vezes o valor do pedido.
- Se você importou um contêiner de US$ 100.000 e é condenado no Brasil a pagar US$ 5 milhões em indenizações (o que é comum em casos de PI por lucros cessantes), a warranty chinesa cobrirá uma fração irrisória do seu prejuízo.
- O saldo gigantesco recai sobre o patrimônio do importador brasileiro.
O Seguro de PI: Uma Rede Repleta de Exclusões
A contratação do seguro de Responsabilidade de PI oferece uma sensação de segurança. As seguradoras não são instituições de caridade; são empresas que lucram maximizando prêmios e minimizando pagamentos através de cláusulas de exclusão meticulosamente elaboradas.
1. A Exclusão por Conhecimento Prévio (Prior Knowledge)
Esta é a maior armadilha. Se o titular da PI (ex: a marca americana original) enviou uma carta de notificação (cease-and-desist) ao importador ou à cadeia de suprimentos antes da contratação do seguro, ou se o importador ignorou sinais óbvios de que estava comprando uma cópia, a seguradora pode e irá alegar “conhecimento prévio”.
- O Resultado: A seguradora se recusa a cobrir os custos de defesa e indenização, deixando o importador sozinho com o litígio de PI, que pode se estender por anos. A presunção de má-fé em casos de contrafação de marcas p. ex., torna essa exclusão ainda mais fácil de ser invocada.
2. Falta de Diligência como Excludente
As seguradoras mais rigorosas agora exigem prova de Due Diligence razoável antes de cobrir o risco.
- Se o importador não puder apresentar um relatório FTO (Liberdade de Operação) assinado por um escritório de PI local, ou não tiver conduzido uma consulta preliminar no INPI, a seguradora pode argumentar que o importador falhou em tomar medidas mínimas razoáveis para evitar a perda.
- A Mensagem É Cruelmente Clara: O seguro de PI só funciona bem quando o risco é acidental e inesperado. Comprar produtos de baixo custo na China com a finalidade expressa de inundar um mercado local com produto similar ao original não é um risco acidental; é uma decisão de negócio arriscada.
A Única Linha de Defesa realmente Válida: Sua Due Diligence
A Due Diligence em PI no Brasil antes de “fechar os contêineres” não é um custo, mas sim um investimento obrigatório e a proteção que, efetivamente, poderá funcionar.
- Como consultor de grandes importadores, a recomendação é clara: Nunca confie apenas na garantia do fornecedor. A cláusula de indenização é uma proteção secundária.
- Sua primeira linha de defesa deve ser sua própria Due Diligence e análise FTO (Liberdade de Operação) realizada por advogados especialistas brasileiros antes de “fechar os contêineres”.
- O importador diligente usa o Due Diligence (análise FTO e Claim\ Charts) para evitar o risco.
- O importador amador tenta transferir o risco (para o fornecedor e para a seguradora), apenas para descobrir, tarde demais, que o passivo sempre retorna para o seu balanço.
Não troque a prevenção pela promessa de compensação. Sua Due Diligence em PI é a única providência que mitigará os riscos de apreensão e processo judicial.
Restando dúvidas envie um e-mail para inpi@avilanascimento.adv.br, ou entre em contato pelo telefone (21) 3208-3838 ou pelo WhatsApp (21) 97272-8787.
Referências:
BRASIL. Lei nº 9.279, de 14 de maio de 1996. Regula direitos e obrigações relativos à propriedade industrial. Diário Oficial da União, Brasília, DF, 15 maio 1996.
Site oficial do escritório Ávila Nascimento Advocacia. Disponível em: https://avilanascimento.adv.br/#informativos. Acesso em 2024.
HOFFMANN, Paulo Roberto. Administração de Riscos no Comércio Exterior. 3. ed. São Paulo: Aduaneiras, 2021.
AMARAL, Antonio Carlos Rodrigues do. Direito do Comércio Internacional. 9. ed. São Paulo: Saraiva Educação, 2023.
FAQ Due Diligence em Importação
Posso confiar na "warranty" de não violação de PI do exportador chinês?
Não, a warranty (garantia de não violação) do exportador chinês é considerada apenas uma proteção secundária e não deve ser sua primeira linha de defesa. A cláusula de indenização (indemnification) é frequentemente uma miragem legal. Se você for processado no Brasil, executar o veredito contra a fábrica na China é exponencialmente mais caro, lento e, na prática, muitas vezes inviável. Além disso, a responsabilidade de indenização costuma ser limitada ao valor do pedido, enquanto os danos no litígio de PI podem ser dez ou vinte vezes maiores.
O seguro contra violação de PI é uma proteção segura para importação da China?
O seguro de Responsabilidade de PI oferece uma sensação de segurança e é, na verdade, uma rede repleta de exclusões. As seguradoras buscam minimizar pagamentos. A principal armadilha é a Exclusão por Conhecimento Prévio (Prior Knowledge). Se você já foi notificado (cease-and-desist) ou se o produto é uma cópia disfarçada (má-fé), a seguradora pode recusar a cobertura, alegando que o risco não foi "acidental e inesperado," deixando o importador sozinho com o litígio.
O que é Falta de Diligência como Excludente em apólices de PI?
A Falta de Diligência é uma cláusula excludente em apólices de PI que permite à seguradora recusar o pagamento se o importador falhou em tomar medidas mínimas razoáveis para evitar a perda. As seguradoras mais rigorosas podem exigir prova de Due Diligence razoável e a apresentação de um relatório FTO (Liberdade de Operação) assinado por um especialista para cobrir o risco.
Qual é a única linha de defesa realmente válida para evitar riscos de PI na importação?
A única linha de defesa válida é a sua própria Due Diligence em PI no Brasil e a análise FTO (Freedom To Operate). O importador diligente usa o Due Diligence (análise FTO e Claim\ Charts) para evitar o risco antes de fechar os contêineres, em vez de depender da promessa de compensação. Confiar apenas na garantia e no seguro é visto como negligência estrutural e wishful\ thinking.
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